12/06/2012 - às 21:34
Caso Matsunaga — Assim, não, procuradora Eluf! Retire aquele texto, retire…
Escrevi um texto nesta manhã sobre a cobertura indecorosa que a imprensa, na média, vem dispensando ao caso Matsunaga. O morto está sendo tratado como vilão; a vilã — perdoem-me a esquisitice de chamar de vilã quem mata e esquarteja —, como vítima. Aponto naquele texto os fatores que explicam essa abordagem estúpida.
Os leitores me enviaram uma intervenção que Luíza Eluf fez no Facebook. Luíza não é uma cidadã comum, como somos todos. Também é procuradora de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo. Mais do que isso. Representou o Brasil na Conferência Internacional da Mulher em 1995, em Pequim, promovida pela ONU. Em 1990, fez parte da comissão que fez propostas para reformar o Código Penal.
Atenção! Por mais que as pessoas, nas redes sociais, falem como "indivíduos", não deixam de ser quem são, especialmente quando opinam sobre matéria ligada à sua área de interesse ou à sua profissão. Pois é… No dia 8, ela perdeu uma excelente chance de tomar um suco de laranja em vez de escrever esta monumental bobagem, a saber:
"A propósito desse novo 'crime da mala' que infelizmente ocorreu em SP, lembro aos maridos que não querem morrer pelas mãos da esposa que não devem comprar armas de fogo nem leva-las para casa. A arma facilita o crime, onde existe arma o perigo é muito grande. E as mulheres perdem o autocontrole com mais facilidade."
O que dizer? Há o tratamento jocoso do tema ("novo crime da mala"), a atribuição de culpa à própria vítima ("levou a arma para casa") e a advertência aos "maridos" — como se crimes dessa natureza fossem uma banalidade, uma decorrência de um mero mau hábito. Mais: há a tese subjacente — de que discordo, vocês sabem — segundo a qual a existência da arma induz a ação do criminoso. Estou entre aqueles que consideram que uma Bíblia em mãos erradas pode servir para esmagar um crânio.
De resto, não esperava ler, não saída da pena de uma histórica defensora das mulheres, a afirmação de que armas são especialmente perigosas nas mãos de mulheres porque elas "perdem o controle com mais facilidade". Heeeiiinnn, procuradora? Como é que é? Pode-se dizer o mesmo sobre, sei lá, o cartão de crédito? Ou sobre os potes de sorvete? Ou sobre os automóveis? Se as mulheres são geneticamente menos compatíveis com armas do que homens, seria o caso de criar limitações especiais para elas ou de haver leis diferenciadas quando matam? "Sabe, meritíssimo, foram os hormônios…"
Não quero satanizar a procuradora, não, e peço que vocês não o façam. Mas convido Luíza Eluf a retirar o pequeno texto que escreveu, com uma penca de bobagens. Foi só um mau momento, certo, doutora?
Por Reinaldo Azevedo
14/06/2012
às 22:13
Caso Matsunaga — Luiza Eluf, procuradora de Justiça, responde a uma crítica do blogue. E eu treplico
Critiquei aqui um comentário que a procuradora de Justiça Luiza Eluf, do Ministério Público do Estado de São Paulo, postou no Facebook sobre o caso Matsunaga. Pareceu-me, vejam lá as razões, que ela foi ligeira e superficial. Seu texto sugere que o responsável último pela própria morte foi Marcos, que deu uma pistola de presente à mulher. Tanto é assim que Luíza recomendou aos "maridos que não querem morrer" que não levem arma para casa… Ela enviou ao blog o comentário que segue abaixo (em vermelho). Volto em seguida:
Sr. Reinaldo Azevedo,
O homicídio atribuído a Eliza Matsunaga contra seu marido Marcos leva a crer que foi, sim, mais um "crime da mala". Ou melhor: das malas. Ela saiu do apartamento levando três malas, conforme gravação das câmeras de segurança do edifício. Se, anos atrás, o esquartejamento de uma mulher foi chamado de crime da mala, por que não reconhecer a semelhança dos casos?
Quanto à existência de arma em casa, é indiscutível que o fato facilita o crime. A experiência mostra que, dificilmente, uma mulher entra em confronto físico com um homem. Uma faca não dá a mesma segurança de sucesso que uma arma de fogo. Uma faca ou uma Bíblia, como sugerido, requerem luta corporal, esforço físico e risco de fracasso no embate. A arma de fogo é mais rápida, mais segura e mais letal. Quase todos os casos de crimes passionais cometidos por mulheres contra seus maridos foram executados com uso de arma de fogo pertencente ao próprio marido. Veja os casos de Zulmira Galvão Bueno, Dorinha Duval e, quem sabe, a morte do Coronel Ubiratan, dentre os famosos, além de alguns outros sem tanta repercussão, nos quais já trabalhei. Lembrando, aliás, que crimes passionais em que a mulher é a autora representam absoluta minoria dos casos no Brasil. E, por fim, informo que a experiência também mostra que as mulheres cometem crimes violentos por impulso, no calor de uma discussão, em um momento de descontrole emocional. Já os homens premeditam suas ações, preparam friamente o ataque, a emboscada, por vezes durante meses, e terminam executando a vítima exatamente como planejado. Sugiro ao jornalista que leia o livro "A paixão no banco dos réus", exatamente sobre o assunto.
Luiza Eluf
Voltei
Começo pelo fim. Tenho certa atração pelos imodestos. Luiza Eluf recomenda, para me tirar das trevas da "inguinorança que astravanca o progressio", um livro de… Luiza Eluf!!! Como amor com amor se paga, eu lhe recomendo "O País dos Petralhas", "Máximas de Um País Mínimo" e "Contra o Consenso". Agora vamos de cima pra baixo. A esta altura, juridiquês à parte, certas esculturas é que são "atribuídas" a Aleijadinho porque não se tem certeza da autoria. Eliza Matsunaga é assassina confessa. E há provas materias de que cometeu o crime.
Uma arma facilita o crime? Tomada pela emoção, uma dessas mulheres com "descontrole emocional", como diz doutora Eluf, poderia lascar uma garrafada na cabeça do marido colecionador de vinhos. Aí seria o caso de advertir: "Maridos, se vocês não quiserem morrer com o crânio rachado, não tenham uma adega".
Justamente porque os crimes passionais cometidos por mulheres representam a absoluta minoria, então não se pode tirar da ocorrência em questão, como fez doutora Luiza, uma regra geral e, pois, uma sentença: "Maridos que não querem morrer não devem levar arma para casa".
Quanto à consideração de que mulheres cometem crimes violentos por impulso, e os homens, por cálculo, vejo nisso uma tentativa de usar um preconceito vicioso, como todos ("mulheres são emocionais, homens são racionais"), num contexto supostamente virtuoso. Ora, o impulso, por óbvio, vem carregado de atenuantes, não é? Já o cálculo… Quem mata porque vítima de um lapso da razão parece, evidentemente, menos perverso do que aquele que planejou meticulosamente a ação. Elas, coitadas!, não têm tempo de pensar; eles, os malvados, matam depois de refletir. No caso da assassina em tela, o "impulso" parece ter durado um tempão. Dado o tiro, ela cuidou nas horas seguintes do esquartejamento.
Sugiro à doutora Luiza que não tente teorizar sobre clichês. Meus livros podem ajudar.
Por Reinaldo Azevedo
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